SILÊNCIO ADMINISTRATIVO E PROTEÇÃO JUDICIAL NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO
José Antonio Savaris
- O quadro: a título de introdução ao artigo – e ao direito previdenciário
Este texto tem como objetivo identificar uma possível solução para o atroz problema do indivíduo que sofre, por omissão abusiva, violação estatal que lhe impede de gozar, em tempo oportuno, o direito previdenciário que requereu administrativamente.
Para essa finalidade, articula-se com importante categoria jurídica do direito administrativo, cujos reflexos no campo previdenciário até agora restam inexplorados: o silêncio administrativo.
Inicialmente, contudo, faz-se necessário um percurso introdutório ao texto que, em verdade, presta-se como uma introdução ao próprio estudo do direito previdenciário. Eventualmente é necessário voltarmos ao princípio ou lembrarmos dos fundamentos, para resgatarmos a essência da coisa mesma, não raro olvidada.
Há uma realidade permanente no mundo previdenciário que, nada obstante, frequentemente passa despercebida ou já é mesmo banalizada. O quadro é de uma pessoa vulnerável que se encontra em uma situação adversa e busca obter, com a brevidade possível, um direito de natureza alimentar que lhe possa garantir o sustento e fazer cessar o estado de precisão.
A incapacidade produtiva, a ausência de condições ou oportunidades para trabalho digno e a falta de recursos materiais para a própria manutenção são marcas muito comuns entre segurados e dependentes da previdência social quando buscam a proteção social.
Esse dado nos faz rememorar que as prestações previdenciárias se destinam a cobrir suficientemente as consequências negativas produzidas pelas contingências sociais. Por essa razão, possuem natureza substitutiva do salário ou do rendimento, caracterizando-se como um direito alimentar intimamente conectado com o direito à vida.
O direito à previdência social é assegurado mediante sofisticada articulação dos Poderes Públicos e da sociedade, fundada na solidariedade, que se mostra indispensável para a própria estabilidade social.
É dessa dupla essencialidade dos direitos sociais de subsistência – prestação de natureza alimentar de indiscutível relevância social – que sobressai sua pertinência material ao rol dos direitos humanos e fundamentais sociais, econômicos e culturais. Mediante eles se protege a dignidade humana de seus beneficiários e sem eles não há paz social.
O pano de fundo dessa realidade permanente é tingido por uma situação de urgência na materialização da proteção previdenciária, pois, como se sabe, a fome e as demais necessidades humanas não esperam.
Quando Alfred Ruprecht considerou o princípio da imediatidade como um dos fundamentais valores da seguridade social, levava em consideração seu principal objetivo: remediar ou ajudar a superar situações que, a serem produzidas por contingências sociais, criam problemas ao indivíduo. Para que o socorro seja efetivo é preciso que a ajuda se realize imediatamente, em tempo oportuno, pois do contrário perderia muito de seu valor. Se a resposta não for imediata, a missão da seguridade é cumprida de forma deficiente[1].
Nestes angustiantes tempos de pandemia – COVID-19 -, a premência por efetividade de uma determinada prestação social de subsistência é reconhecida e declarada a todo momento pela opinião pública e pelos mais diversos atores políticos, tendo em consideração os nefastos efeitos humanos e sociais causados pela demora para a operacionalização e pagamento do auxílio-emergencial a seus destinatários legais[2].
- O contraste: a urgência do direito e a lentidão excessiva na sua proteção
Talvez nunca esteve tão presente entre nós, como nestes tempos de isolamento social em razão de pandemia, o caráter urgente das prestações sociais de natureza alimentar. E seria desnecessário dizer que também as prestações previdenciárias são revestidas de uma tal premência, não fosse a relativa indiferença com que é gerida ou encarada a atual e notória inércia ou demora sine die da Administração para processamento e análise dos requerimentos que lhe são dirigidos.
É preciso, em razão dessa inaceitável passividade, reabilitar o caráter urgente de uma prestação previdenciária, encontrando soluções jurídicas para se fazer superar a aflitiva situação de milhões de segurados e dependentes que aguardam indefinidamente a conclusão dos processos administrativos de concessão e de revisão de benefícios junto ao ente previdenciário, conforme noticia amplamente a imprensa (veja aqui).
Já tivemos ocasião de expressar o pensamento de que se eventual ilegalidade da Administração Pública pode alcançar uma generalidade de pessoas, é recomendável que ela seja corrigida mediante o emprego de uma tutela coletiva, de cunho inibitório, pois é contraproducente a adoção de ferramentas artesanais, em demandas individuais, para julgamento de verdadeiras causas de massa[3].
Nessa perspectiva, uma solução judicial possível para a excessiva e indevida demora administrativa para análise dos requerimentos de concessão de benefícios poderia alcançar a seara do problema fundamental que subjaz a essa absurda ineficiência dos serviços públicos previdenciários: a insuficiência de recursos pessoais e materiais, isto é, a falta de estrutura administrativa e de um corpo funcional suficientemente qualificado para fazer frente à demanda social.
Ainda nessa ótica da correção institucional de forma abrangente, não seria desarrazoado identificar nesse contexto administrativo previdenciário caótico o que a Corte Constitucional colombiana denominou como um estado de coisas inconstitucional – ECI, entendido por Carlos A. Azevedo como um quadro de “omissões estatais, estruturais, que impliquem não apenas a falta de efetividade dos direitos fundamentais, mas um quadro de violação massiva desses direitos”.[4]
SILÊNCIO ADMINISTRATIVO E PROTEÇÃO JUDICIAL NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO
- Silêncio administrativo: uma categoria – também – do direito previdenciário
A inatividade formal do Poder Público[5], deixando de conceder ou indeferir a pretensão do particular, no prazo legal, culmina por violar o direito constitucional de petição em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder (CF/88, art. 5º, XXXIV, “a”), bem como o direito fundamental ao devido processo legal no âmbito administrativo (CF/88, art. 5º, LIV e LV), que abrange o direito à duração razoável do processo administrativo (CF/88, art. 5º, LXXVIII) [6].
Trata-se de inobservância, por parte do Poder Público, de seu dever de respeitar e garantir os direitos de previdência social, incorrendo, com a abusiva demora apurada nos processos administrativos, em violação dos direitos humanos, pois contraria a Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 1º)[7] e seu Protocolo Adicional, que consagra, em seu art. 9º, o Direito Humano à Previdência Social[8].
Desde a perspectiva do direito administrativo, a ausência de resposta pelo Poder Público, no prazo legal, aos pleitos que lhe são dirigidos pelo particular, caracteriza o que se denomina silêncio administrativo.
Com efeito, a concepção doutrinária predominante em nosso país considera silêncio administrativo a “omissão da Administração quando lhe incumbe manifestação de caráter comissivo” [9], isto é, a falta de pronunciamento da Administração “quando deve fazê-lo porque foi provocada por administrado que postula interesse próprio”[10].
De acordo com esse pensamento, portanto, aperfeiçoa-se o silêncio administrativo com a inatividade formal da Administração Pública, que é caracterizada pelo descumprimento do prazo legal para a emissão de resposta às pretensões que lhe são dirigidas[11].
Diante dessa omissão ilegal e abusiva do Poder Público, dois caminhos de proteção judicial se abrem ao particular.
3.1 Circularidade ou esquiva institucional: a postura convencional da tutela jurídica contra o “não-ato”
A primeira saída é a busca pela censura judicial da omissão, com a determinação para que seja dada resposta administrativa em prazo razoável. Essa perspectiva, pode-se dizer, representa uma postura mais tradicional da jurisprudência em matéria previdenciária[12].
Partindo implicitamente da premissa de que a ausência de resposta administrativa não produz qualquer efeito jurídico (nem indeferimento tácito, nem concessão tácita), essa orientação busca chamar a Administração às raias da legalidade, determinando a finalização do processo administrativo. Por consequência, reserva-se o exercício da jurisdição previdenciária – de acolhimento ou rejeição do direito postulado – apenas para os casos de denegação expressa pelo órgão previdenciário. Trata-se de uma forma de aceleração do processo administrativo.
Em situações de normalidade institucional, essa alternativa aparenta ser a mais adequada, pois se presta como ferramenta de controle em favor do órgão gestor da previdência social, em seu exercício da tutela administrativa. Se alguns poucos processos acabam por ter sua solução retardada, uma intervenção judicial episódica, aqui e acolá, culmina por alertar a instituição pública quanto a alguns desajustes pontuais[13].
Em um contexto de colapso dos serviços públicos previdenciários, contudo, a ordem judicial para resolução do processo administrativo em tempo razoável nada mais significa do que fazer alguns segurados saltarem a frente de outros, de modo que a solução de qualquer um dentre os milhões de processos retidos ou atrasados poderia passar a depender de uma primeira ordem judicial de advertência para aceleramento do processo e cumprimento do dever de tutela administrativa.
Presente a urgência dos direitos sociais de subsistência, é necessário evitar o que chamamos de um ambiente de esquiva institucional à pretensão de proteção social dos mais vulneráveis, esse antidemocrático jogo burocrático de portas fechadas ao cidadão[14].
3.2 A tese: o silêncio administrativo negativo e a prioridade da tutela dos direitos
Uma alternativa de proteção judicial ao problema da demora excessiva do Poder Público na análise dos requerimentos administrativos previdenciários é a de considerar a ausência de resposta no prazo legal como silêncio administrativo negativo, isto é, um indeferimento tácito, abrindo-se espaço para a busca judicial do direito previdenciário[15].
Note-se que, neste caminho, diferentemente do primeiro, o órgão jurisdicional não se limita a determinar que a Administração se manifeste, mas supre a omissão estatal, pronunciando-se sobre a existência ou não do direito material em si.
A problematização do silêncio administrativo como instrumento idôneo – ou não – para habilitar o acesso à justiça em matéria previdenciária só existe porque não há norma legal a atribuir, à ausência de resposta, o efeito de um indeferimento tácito. Isso porque inexiste problema em se identificar as consequências jurídicas do “não-ato” quando elas são expressamente previstas por lei.
Se entendermos que, nos processos de concessão ou de revisão de benefício previdenciário, o silêncio administrativo tem natureza negativa, implicando o indeferimento tácito do requerimento formulado pelo particular, este terá garantido o acesso à justiça tal como se o seu pleito fosse expressamente rejeitado pela autarquia previdenciária. Logo, a mora administrativa, caracterizando o silêncio administrativo negativo, permitiria ao particular ingressar em juízo, sem que se pudesse falar em ausência de interesse processual.
Em nosso modo de ver, é imprescindível proteger juridicamente o direito de caráter substantivo (direito previdenciário) que se encontra obstruído pela inércia administrativa que, como anteriormente sustentado, implica uma omissão estatal que impede o gozo efetivo de direito humano e fundamental que possui natureza urgente. Como consequência, deve-se permitir, nesses casos, o acesso à proteção judicial (garantia jurisdicional), que constitui outro direito de dignidade fundamental[16].
Deve ser tomado como aspecto importante da questão os danos de diferentes ordens que pode sofrer o segurado da previdência social em razão da demora indefinida do órgão previdenciário para decidir o requerimento administrativo.
De todo modo, é importante advertir que a falta de conclusão administrativa implica, por consequência lógica, ausência de fundamentação para a denegatória administrativa – que é tácita. À míngua de melhor delimitação da controvérsia, em alguns casos não se terá certeza sobre o que seria outorgado ou reconhecido na instância administrativa, exigindo do particular, por cautela, a demonstração, em juízo, da existência de todos os elementos constitutivos do direito.
SILÊNCIO ADMINISTRATIVO E PROTEÇÃO JUDICIAL NO DIREITO PREVIDENCIÁRIO
3.3 A tese confortada: o posicionamento do Supremo Tribunal Federal
No direito pátrio, não há nenhuma norma a dispor sobre a necessidade da existência de um ato administrativo expresso, contrário aos interesses do particular, para que se possa iniciar uma demanda judicial.
Ao contrário, ao definir os condicionamentos que sofre o direito constitucional de acesso à justiça (CF/88, art. 5º, XXXV[17]), o Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Tema 350 (Prévio requerimento administrativo como condição para o acesso ao Judiciário), dispôs que “A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise” (negrito nosso)[18].
Conforme se pode verificar do voto de lavra do Min. Roberto Barroso, houve a compreensão de que “Eventual lesão a direito decorrerá, por exemplo, da efetiva análise e indeferimento total ou parcial do pedido, ou, ainda, da excessiva demora em sua apreciação (isto é, quando excedido o prazo de 45 dias previsto no art. 41-A, § 5º, da Lei nº 8.213/1991)” (Item 16, pág. 6 do voto do Relator).
No mesmos sentido, colhe-se do voto do saudoso Min. Teori Zavascki que “A resistência pode se manifestar até mesmo pela demora na apreciação do pedido, ou, até, pela negativa de recebê-lo. O que não se admite é que sejam postulados diretamente em juízo benefícios previdenciários cuja concessão depende, necessariamente, da iniciativa do segurado” (Item 5, pág. 3 deste voto).
Também o Min. Gilmar Mendes expressou que “do ponto de vista da dogmática constitucional, é possível que a proteção judicial efetiva mereça uma disciplina legal, desde que isso não represente um embaraço, uma coarctação do direito de entrar na Justiça. E isso ficou muito claro no voto de Sua Excelência. Toda vez que puder se interpretar a demora, a recalcitrância, como pretensão resistida (…) poder-se-á lançar mão da intervenção judicial” (Pág. 4 deste voto).
Em suma, a Suprema Corte, de acordo com a sistemática de repercussão geral, definiu que a ausência de resposta administrativa habilita o segurado a postular judicialmente o direito material previdenciário, indo ao encontro do que se argumenta neste texto, no sentido da aplicação do instituto do silêncio administrativo no campo da seguridade social.
A título de despretensiosa comparação, assinala-se que esse também é o entendimento da Corte Suprema de Justiça e da Nação argentina. Em análise desse preciso problema e em um contexto social, político e jurídico muito semelhante ao nosso, entendeu-se pela desnecessidade de um ato administrativo expresso, como condição para se acorrer à via jurisdicional. É que uma tal condição poderia dar à autoridade administrativa condições de impedir a propositura de demandas judiciais apenas mediante a não resolução dos requerimentos que lhe são dirigidos. Merece transcrição, nesse ponto, excerto da ementa desse importante precedente:
“El instituto del silencio administrativo nació para evitar excesos de la Administración pública que tiene la obligación de decidir en término las causas que se le plantean de modo que, frente la inactividad, el interesado cuenta con la facultad de recorrer la vía judicial como si hubiera recaído resolución expresa, aun que no exista, porque cabe descalificar pronunciamiento de la Cámara Federal de Seguridad Social que declaró, “in limine” no habilitada la instancia judicial por ausencia de resolución expresa de la Administración Nacional de Seguridad Social, violando derechos que cuenta con protección constitucional”[19].
- Considerações finais deste artigo.
Como arremate do que foi aqui articulado, pode-se expressar que, em face da inatividade formal do órgão previdenciário no contexto de requerimento administrativo de benefício, resta aperfeiçoado o silêncio administrativo negativo, expressando-se como um indeferimento tácito, hábil a permitir ao segurado, em desejando, o ingresso com a ação judicial correspondente.
É necessário reconhecer, porém, que a orientação aqui defendida não é a ideal desde uma perspectiva da Administração da Justiça, visto que, em não havendo uma alteração no estado de coisas no campo político-administrativo, a tendência será de um incremento do número de demandas contra o já maior litigante do país (INSS).
Todavia, como observou a Min. Carmen Lúcia em seu voto quando do julgamento do RE 631.240, “considerando que a possibilidade de acesso à justiça, com todos os problemas, as questões inclusive que são postas a nós no sentido de se precisar repensar o Poder Judiciário, mas há de se repensar a partir de estruturas e formas e não a partir daquilo que a parte, que muitas vezes é uma parte mais fraca, como bem dito pelo Ministro Marco Aurélio, haverá de sofrer na sua possibilidade de aceder (Pág. 2 deste voto).
Em outras palavras, não é aceitável que a burocracia estatal faça pouco dos direitos humanos e fundamentais, cuja gozo efetivo deve ser assegurado, residindo justamente aí a importância da proteção judicial.
Mais do que isso, voltamos a expressar que é preciso considerar seriamente os pleitos de sanção judicial indenizatória pela demora administrativa sine die[20]. Isso porque, em vários casos, o ente previdenciário impõe aos seus carentes beneficiários, não apenas uma situação de constante ausência de recursos materiais, mas uma condição psicológica ultrajante, em face da incerteza que passa a fazer parte de seu cotidiano, da insegurança alimentar que lhe desafia diariamente, da necessidade de depender de outras pessoas para sua subsistência, todo um drama de pobreza que talvez tenha ficado mais claro nestes tempos em que se destaca a necessidade urgente dos vulneráveis e trabalhadores informais em meio a uma pandemia.
Porventura, o custo pelo enfraquecimento dos serviços públicos previdenciários poderá não compensar aquilo que eventualmente se possa cogitar ser uma receita indireta estatal, pelo não pagamento oportuno de benefícios ou pelo alongamento indevido do processo administrativo.
Oxalá uma sanção jurídica proporcional possa eventualmente trazer repercussões positivas, desde a perspectiva da necessidade de estruturação e aparelhamento do ente previdenciário, ainda que o impulso resolutivo seja orientado não pelo respeito aos direitos, mas – uma vez mais – desde uma perspectiva meramente econômica.
- Referências
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 22ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2007.
CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Estado de coisas inconstitucional, Salvador: Juspodivm, 2016.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
MODESTO, Paulo, Silêncio Administrativo Positivo, Negativo e Translativo: a omissão estatal formal em tempos de crise. In: Revista brasileira de direito público : RDP : Belo Horizonte: Fórum, ano 15, n. 57, abr./jun. 2017. 300 p.
SAVARIS, José Antonio. Direito Processual Previdenciário 8ª Ed, Curitiba: Alteridade Editora, 2019.
José Antonio Savaris é Juiz Federal da 3a Turma Recursal da SJPR (TRF4), Doutor em Direito pela USP e Coordenador e Professor do Curso de Pós-Graduação em Direito Previdenciário da ESMAFE-PR. Presidente de Honra do IBDP.
[1] RUPRECHT, Alfredo J. Derecho de la seguridad social. Buenos Aires: Zavalia, 1995. p. 81.
[2] O auxílio-emergencial corresponde ao pagamento de R$ 600,00 (seiscentos reais) mensais, durante o período de 3 (três) meses, aos trabalhadores especificados no art. 2º da Lei 13.982, de 02/04/2020.
[3] SAVARIS, José Antonio. Direito Processual Previdenciário, Curitiba: Alteridade Editora, 2019. p. 156-157.
[4] CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Estado de coisas inconstitucional, Salvador: Juspodivm, 2016. p. 58. A tese do Estado de Coisas Inconstitucional (ECI) já foi adotada no Brasil, pela Suprema Corte, quando do julgamento da ADPF n. 347, que tinha como objeto o sistema carcerário brasileiro, havendo o STF identificado na superpopulação carcerária e nas condições desumanas de custódia uma “violação massiva e persistente de direitos fundamentais, decorrente de falhas estruturais e falência de políticas públicas e cuja modificação depende de medidas abrangentes de natureza normativa, administrativa e orçamentária, deve o sistema penitenciário nacional ser caraterizado como “estado de coisas inconstitucional”. (ADPF 347 MC, Rel. Min. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. 09/09/2015, DJe 19/02/2016). Embora se possa explorar essa problemática de modo consistente, essa tarefa extrapolaria o objetivo fundamental do presente texto.
[5] A inatividade formal da Administração ocorre no contexto de um processo administrativo, com a mora da Administração em decidir expressamente o pleito de um particular. Já a inatividade material é caracterizada pela omissão quanto aos deveres que se inserem na competência de determinado órgão público, de que podem ser exemplos a falta do serviço de conservação de rodovias ou ausência do serviço de coleta de lixo.
[6] Sobre o prazo para solução administrativa dos requerimentos previdenciários, o art. 49 da Lei 9.784/99 estabelece que a Administração Pública Federal tem o prazo de até 30 (trinta) dias, após a conclusão do processo administrativo para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada. A Lei do Processo Administrativo Federal, porém, é de aplicação subsidiária, conforme dispõe seu art. 69. Por isso, o prazo a ser observado é aquele disposto pela legislação previdenciária, que dispõe: “O 1o (primeiro) pagamento de renda mensal do benefício será efetuado até 45 (quarenta e cinco) dias após a data da apresentação pelo segurado da documentação necessária a sua concessão” (Lei 8.213/91, art. 41-A, § 5o).
[7] O Pacto de San Jose da Costa Rica foi ratificado pelo Brasil em 1992, sendo promulgado pelo Decreto 678, de 06/1/1992.
[8] O Protocolo Adicional à Convenção Americana sobre Direitos Humanos em Matéria de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais “Protocolo de São Salvador” foi promulgado pelo Decreto 3.321, de 30/12/1999. Estabelece o art. 9º deste instrumento internacional, in verbis: “1. Toda pessoa tem direito à previdência social que a proteja das conseqüências da velhice e da incapacitação que a impossibilite, física ou mentalmente, de obter os meios de vida digna e decorosa. No caso de morte do beneficiário, as prestações da previdência social beneficiarão seus dependentes. 2. Quando se tratar de pessoas em atividade, o direito à previdência social abrangerá pelo menos o atendimento médico e o subsídio ou pensão em caso de acidentes de trabalho ou de doença profissional e, quando se tratar da mulher, licença remunerada para a gestante, antes e depois do parto”.
[9] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007. p. 94.
[10] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 22ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 395.
[11] Uma visão mais restritiva de silêncio administrativo não se satisfaz com a inatividade formal da Administração ou com simples ausência de resposta do Poder Público no prazo legal, exigindo, para sua caracterização, a existência de previsão legal dos efeitos jurídicos da omissão administrativa. Desde essa concepção, tem-se o silêncio administrativo apenas quando a falta de decisão no prazo legal implica, por disposição lega, a concessão (silêncio administrativo positivo) ou o indeferimento (silêncio administrativo negativo) do pleito formulado pelo particular. Para Paulo Modesto, afiançando o que considera doutrina convencional, “A omissão converte-se em silêncio administrativo apenas quando é prevista expressamente em norma, com enunciação também de efeitos ope legis, substitutivos da decisão ou declaração omitida pela Administração. Em termos sintéticos: silêncio administrativo é a omissão qualificada a que norma jurídica atribui efeitos substitutivos da decisão expressa da Administração Pública”. (MODESTO, Paulo, Silêncio Administrativo Positivo, Negativo e Translativo: a omissão estatal formal em tempos de crise. In: Revista brasileira de direito público : RDP : Belo Horizonte: Fórum, ano 15, n. 57, abr./jun. 2017. 300 p).
[12] A título ilustrativo: TRF4, AC 5096271-13.2019.4.04.7100, Sexta Turma, Relator Julio Guilherme Berezoski Schattschneider, juntado aos autos em 19/03/2020.
[13] Ainda assim não deixa de ser problemática a opção pela tutela meramente processual contra a mora administrativa. Isso porque não pode o segurado ser obrigado a ingressar com um mandado de segurança a cada ato administrativo em que há lentidão. Soa desproporcional, por exemplo, que após uma primeira judicialização para aceleração do trâmite processual e obtenção da conclusão administrativa, tenha o segurado que buscar em juízo que o INSS não deixe de encaminhar o recurso administrativo à Junta de Recursos da Previdência Social e que esta analise o inconformismo em prazo razoável. A Administração como um todo tem o dever de observar a cláusula da duração razoável. E não se deve para exigir que o segurado, a cada omissão, impetre nova ação mandamental.
[14] SAVARIS, José Antonio. Direito Processual Previdenciário 8ª Ed, Curitiba: Alteridade Editora, 2019. p. 250.
[15] A depender do efeito que se empreste à falta de decisão administrativa, pode-se compreender o silêncio administrativo como negativo ou positivo. Em outras palavras, a quebra do dever de decisão expressa pela Administração Pública nos processos instaurados por interesse de particulares poderá implicar, por ficção legal, um indeferimento (hipótese de silêncio negativo) ou um posicionamento concessório (hipótese de silêncio positivo). Exemplo de silêncio positivo pode ser encontrado na Lei 13.874/2019, produto de conversão da MP da Liberdade Econômica que, dentre outros pontos, em seu art. 3º, IX, estabeleceu que “São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País (…)”: “IX – ter a garantia de que, nas solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica que se sujeitam ao disposto nesta Lei, apresentados todos os elementos necessários à instrução do processo, o particular será cientificado expressa e imediatamente do prazo máximo estipulado para a análise de seu pedido e de que, transcorrido o prazo fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei”.
[16] Convenção Americana de Direitos Humanos, art. 25, item 1: “Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo, perante os juízos ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela constituição, pela lei ou pela presente Convenção, mesmo quando tal violação seja cometida por pessoas que estejam atuando no exercícios de suas funções oficiais”.
[17] Art. 5º, XXXV: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário, lesão ou ameaça a direito.”
[18] RE 631.240, Plenário. Rel. Min. Roberto Barroso, j. 03.09.2014, DJe 10.11.2014.
[19] VIllareal, Clara B. contra Administración Nac. de la Seguridad Social, j. 15/11/2005, DJ 2005-3, 932.
[20] O tema já foi objeto de provocação em nosso Direito Processual Previdenciário 8ª Ed, Curitiba: Alteridade Editora, 2019. p. 265.